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Escondem-se as vontades em nome de regras que não inventámos. Ficamos prisioneiros de um desejo que julgavamos ter desvanecido. Impomos limites quando o corpo nos diz para os não ter. E a agitação renasce ao vermos a flor que brotou no deserto que teimosamente regamos quanto todos nos olhavam incrédulos. Colhe-la ou apenas olha-la; instala-se a dúvida e esperamos respostas. Há demasiado tempo quando queremos que o não haja e sossegamos o corpo quando ele nos pede que o deixemos tomar as rédeas. Enquanto isso ficam as palavras, fica o arrepio, o contar de minutos até que saibamos o que mais crescerá na areia que cultivamos. (Oldmirror)
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Quantas noites há neste planeta?
quanta paz na escuridãode luz na sabedoria?
Quantos mortos até à morte?
Quanto? Quantos passos traçaram
com os vossos pés, com as vossas mãos
quantas notas ligaram
quantas vozes enlaçaram
neste deserto sem fim?
Quanto amor há no vosso amor
vós que traçais na areia
os esquemas dos vossos conhecimentos
os teoremas do esplendor
a fórmula infalível da existência?
Quantas noites há na vossa vida?
Quantos oceanos no vosso corpo?
Quantas ilhas moram
no arquipélago atlântido da vossa alma?
Quantas velas nos vossos olhos
e o fogo
onde o puseram?
No léxico das vagas?
Na gramática do céu
hoje tão enevoado?
Quantos rodeios e convenções
quantas indecisões fratricidas
por princípio, em teoria
quantas vozes entorpecidas
no capítulo do coração?
Quanto amor no silêncio impossível deste planeta?
Que fizeram de tudo isso
por entre as ditaduras físicas
zombarias animais
extravios de suburbanos
entre os intelectos arrefecidos
e as comédias fraternais?
Que fizeram do vosso amor?
Que fizeram das vossa vida? que disseram?
Quantos ramos de flores esmagados nas vossas mãos?
Quantas paixões alucinadas
quantas horas de gabarolice
por cada aventura inverosímil?
Quantas notas há no vosso amor?
Quantos objectivos?
Quantos talismãs nos vossos preconceitos?
Quantas fogueiras? Quanto rigor antropológico
quanta sinceridade
nesse desespero estruturado bem no mais fundo da cabeça
Quantas miragens exactas
nesta alegria empolada?
Quantas respirações controladas
no exercício da mentira
que nunca basta, nunca? Quanto amor há no vosso amor?
Quantos dias na vossa vida?
Quantas mulheres e quantos homens
no vosso exército?
E que fardo os obrigam a transportar? Quantas notas ligaram
quantas vozes enlaçaram
neste deserto sem fim? E afinal, porquê?
- Hélène Monette
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Sempre um prazer ler o que escreves. Espero-te bem. Beijos enormes e imensos abracos.
não me perdôo por ter ficado tanto tempo longe daqui.
quanta beleza...
Beijo!