352
Leitor: Já o leio há anos e não consigo vislumbrar-lhe uma única luz, uma única réstea de boa disposição...
Eu: Mas consegue vislumbrar alguma coisa?
Leitor: Imensas, se assim não fosse não continuaria a vir lê-lo todos os dias, ávidamente.
Eu: Só lhe posso então dizer duas coisas: 1º - consegue mais do que eu que nunca vislumbro o que quer que seja nas palavras que me saem; 2º - faz mal vir ler-me, ainda por cima ávidamente, todos os dias, porque sem luz e boa disposição a saúde tende a esvair-se.
Leitor: Mas não o quis criticar, tem um estilo muito seu, incrivelmente viciante.
Eu: Mas quis eu criticar-me. Quanto ao estilo, bom, parece-me que a falta de luz gera dessas confusões.
Leitor: E há o amor, as emoções, as relações, os sentimentos, o erotismo, o sexo nu e cru...
Eu: E há a necessidade de encerrar esta entrevista... (by mail)
Eu vagueava no ouro do vento,
declinando o refúgio das aldeias
onde o meu coração fora violentamente despedaçado.
Da dispersa torrente da vida estagnada extraíra eu o leal significado de Irene.
A beleza desfraldava-sedo seu fantasioso invólucro,
dava rosas às fontes.
A neve surpreendeu-o.
Ele debruçou-se sobre o rosto aniquilado,
bebeu dele a superstição em longos tragos.
Depois afastou-se,
movido pela perseverança daquele marulho,
daquela lã.
- René Char
Etiquetas: René Char
"Leitor: E há o amor, as emoções, as relações, os sentimentos, o erotismo, o sexo nu e cru..."
Responde a isto. Há?
Talvez haja a fuga.Nada disso é mau. Vemos (lemos) o que queremos ver (ler). As cores somos nós (leitores) que as trazemos. Quem escreve dá pouco de si, dá um tanto de todos os leitores.
Deixo-te um beijo (há muito que não o faço)