3/19/2010

373



E aos poucos diminui a urgência, cresce a paciência. Gota a gota saboreia-se, não se engole. O fumo dança na boca já sem invadir, sem pedir licença, os pulmões. Caminha-se mais, corre-se menos. Chora-se mais, chora-se mesmo. Ri-se menos, ri-se mesmo. Aumenta a angústia porque aumenta a certeza que há demasiadas coisas de capital importância e escasso tempo para as olhar, com tempo; para as olhar, sequer. Aos poucos somos mais pele, menos carne; mais toque, menos...toque. Conhecemos o quarto acorde, exigimos o quinto e o sexto. Aos poucos o coração bate menos, mas mais. Viveremos menos, mas mais. Aos poucos conseguimos parar, para avançar... [Oldmirror]

Naquele tempo falavas muito de perfeição,
da prosa dos versos irregulares
onde cantam os sentimentos irregulares.
Envelhecemos todos, tu, eu e a discussão,
agora lês saramago & coisas assim
eu já não fico a ouvir-te como antigamente
olhando as tuas pernas que subiam lentamente
até um sítio escuro dentro de mim.
O café agora é um banco, tu professora do liceu:
Bob Dylan encheu-se de dinheiro, o Che morreu.
Agora as tuas pernas são coisas úteis, andantes,
e não caminhos de andar como dantes,
chamando do fundo do meu coração.
- Manuel António Pina

Etiquetas:

Estou no blog.com.pt - comunidade de bloggers em língua portuguesa
Oldmirror© 2005-2011 All Rights Reserved.