2/03/2006

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Poder correr Mundo sem que a casa desabe. Ir ali, ir lá longe, sem que a culpa nos invada e nos impeça de seguir viagem. Partilhar tranquilamente o espaço apenas entendendo-nos, apenas bastando existirmos. Saber que podemos voltar. Saber que nos espera o sorriso e o abraço. Ter a certeza que vale a pena regressar. Partir e ter vontade de voltar, ainda que seja um dia. Saber esperar. Termos um porto seguro sem paragens obrigatórias, sem escalas forçadas. Levados pelo vento, trazidos pelo cansaço e pela saudade. Abrigados do Mundo depois do Mundo nos virar do avesso. Sermos nós. Tirarmos bilhete de ida e não de volta, mas voltarmos...sempre. (Oldmirror)

A noite passada acordei com o teu beijo
descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
vinhas numa barca que não vi passar
corri pela margem até à beira do mar
até que te vi num castelo de areia
cantavas "sou gaivota e fui sereia"
ri-me de ti "então porque não voas? "
e então tu olhaste
depois sorriste
abriste a janela e voaste
A noite passada fui passear no mar
a viola irmã cuidou de me arrastar
chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
olhei para baixo dormias lá no fundo
faltou-me o pé senti que me afundava
por entre as algas teu cabelo boiava
a lua cheia escureceu nas águase então falámos
e então dissemosaqui vivemos muitos anos
A noite passada um paredão ruiu
pela fresta aberta o meu peito fugiu
estavas do outro lado a tricotar janelas
vias-me em segredo ao debruçar-te nelas
cheguei-me a ti disse baixinho "olá",
toquei-te no ombro e a marca ficou lá
o sol inteiro caiu entre os montes
e então olhaste
depois sorriste
disseste "ainda bem que voltaste".

- Sérgio Godinho

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