10/18/2006

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Já devia ter aprendido que há limites. Devia saber que quem contempla a linha do horizonte e se deslumbra dificilmente arriscará a desilusão de conhecer o que está para além do olhar, dificilmente fará mais do que esboçar uma felicidade construída por trás do olhar. Deveria ter aprendido que há limites. Que quase sempre quatro paredes, uma cidade, um acordar e um adormecer, um filho, um amor alternativo, são suficientes para a ilusão de uma vida vivida. Devia aceitar que há limites. Há limites pintados naquela vida que nunca chegará a conhecer a necessidade do incerto mas a fantasia de uma vida. Há limites naquela vida, recusados mas vividos. Não dá mais, não consegue, são os limites. Já devia ter aprendido que há limites. (Oldmirror)

A vida prejudica a expressão da vida. Se eu tivesse um grande amor nunca o poderia contar. Eu próprio não sei se este eu, que vos exponho, por estas coleantes páginas fora, realmente existe ou é apenas um conceito estético e falso que fiz de mim próprio. Sim, é assim. Vivo-me esteticamente em outro. Esculpi a minha vida como a uma estátua de matéria alheia ao meu ser. Às vezes não me reconheço, tão exterior me pus a mim, e tão de modo puramente artístico empreguei a minha consciência de mim próprio. Quem sou por detrás desta irrealidade? Não sei. Devo ser alguém. E se não busco viver, agir, sentir, é - crede-me bem - para não perturbar as linhas feitas da minha personalidade suposta. Quero ser tal qual quis ser e não sou. Se eu cedesse destruir-me-ia. Quero ser uma obra de arte, da alma pelo menos, já que do corpo não posso ser. Por isso me esculpi em calma e alheamento e me pus em estufa, longe dos ares frescos e das luzes francas - onde a minha artificialidade, flor absurda, floresça em afastada beleza.

- "Bernardo Soares"

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4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Os limites somos nós que os impomos.
Acredita que não há limites para amar.

beijos

10/18/2006 11:49:00 da manhã  
Blogger Aestranha said...

O caminho da transcendência/imanência é sempre um espinho em nós, uma dúvida persistente que se instala. Não sei se como se diz acima não existe limite para amar, apenas estou em crer que ainda não encontrei um limite para ser...

Beijo

10/18/2006 12:27:00 da tarde  
Blogger Mia said...

Sabemos que estao lá, demarcam uma fronteira entre esta cadencia das horas, do tempo, entre este turpor que nos tolhe, que nos embarga o movimento, uma fronteira entre esta pequena vida que levamos e o que está para lá do horizonte. Sabemos que existem mas mesmo assim o nosso olhar nao deixa de perscrutar, de procurar a linha do horizonte. Procuramos aceitar os limites e fortalecer essas fronteiras, com compromissos, com laços, com deveres, com obrigações, tentamos aquietar essa ansia, essa insatisfação, mas o nosso olhar acaba sempre por se erguer para o infinito.
E por vezes, só por vezes, ousamos passar os limites demarcados, ousamos ir um pouco mais longe no caminho, ousamos sentir um pouco mais. E esses escassos rasgos de liberdade, revelam que ainda nao estou pronta para aceitar ...

10/18/2006 02:23:00 da tarde  
Blogger Cecilia M said...

É tão mais fácil não passar dos limites! Mas só depois de por em causa os limites e o nosso mundo é que realmente estamos vivos, é o quebrar de regras em que os sentimentos imperam sobre a razão que nos dá a vontade e força de gritar e viver.

10/18/2006 07:05:00 da tarde  

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