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[Johnny e Roseanne Cash / Hiltons, Virginia, 2001, by AnnieLeibovitz]Como descrever o estado de felicidade provocada por um simples nada, uma simples existência que nada mais é do que a monotonia dividida por dois e vivida a dois? Como preencher o espaço branco deixado para traduzir o espírito de um 'para sempre' construído por pequenos nadas que agitam mais um coração que um temporal de emoções procuradas na vertigem de um mundo que roda lá por fora? Como se explica o nada? Como se explica que tudo se resume a estar e morrer estando? Quem entenderia a certeza da eternidade num quadro onde estar lado a lado é bem mais do que caminhar lado a lado porque não importa ir a lado algum? Quem entenderia que a escolha feita resulta na mais simples das existências, olhando os dias nascerem e morrerem sem que tenhamos que pintar-lhes um único traço que assinale a nossa presença? Era uma vez dois corpos que por muito tempo viveram afastados um do outro, desafiando resistências, acelerando o fim, procurando a lucidez no imaginário, assentando arraiais no fundo de todos os poços a quem chamaram palácios. Era uma vez dois corpos que, cansados, juntaram ombros, deitaram-se e ficaram o tempo que lhes restava existindo, respirando, sorrindo e coleccionando nadas porque tinham tudo, ali mesmo, onde nada crescia, nem eles. Nunca souberam se se amavam porque nunca se lembraram disso, nunca souberam como era o mundo olhado a quatro mãos porque há muito tinham deixado o mundo, mas aprenderam cada nota soltada pela respiração que trocavam, cada cor que compunha um sorriso ou uma lágrima que soltavam, cada sabor deixado pelos dias, cada espelho revelado pelas gotas de suor lbertadas de comum acordo. Nunca souberam o que era o tudo porque sempre preferiram o nada. (Oldmirror)
A tua cabeleira de laranjas no vazio do mundoNo vazio dos vidros densos de silêncioE de sombra onde as minhas mãos nuas te procuram os reflexos.
A forma do teu coração é quiméricaE o teu amor parece-se com o meu desejo perdido.Ó suspiros de âmbar, sonhos, olhares.
Mas tu sempre estiveste comigo.A memóriaObscurece-se-me porque te vi chegarE partir. O tempo serve-se de palavras como o amor.- Paul EluardEtiquetas: Paul Eluard

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