1/07/2008

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As tentativas de juntar palavras tornara-se um sofrimento. As vezes que ligara e desligara o ecrã foram demasiadas, sem que entendesse porque é que o tema lhe criava um bloqueio assustador. Começou as preencher o vazio com lamentos desesperados com a esperança de que estes formassem o urgente texto. Com o correr do cursor acabou descobrindo que a dificuldade não estava na escrita, nem mesmo na compreensão que tinha sobre ela; a dificuldade estava em si mesmo, na dificuldade que sempre encontrara em explicar-se, em compreender-se e em passar ao ecrã os escassos resultados de uma significativa fatia da vida passada a procurar essas mesmas respostas. Sabia o que era, como era, o que queria, o que pensava, desejava, sonhava, temia, amava, odiava, escrevia, representava, dançava. Sabia quem era, mas nunca conseguira ordenar tudo isto numa espécie de manual do utilizador como sempre conseguira fazer sempre que olhava para o lado. (Oldmirror)
Sei muito bem o que estás a pensar: então agora já não basta ouvi-la, é preciso, ainda por cima, olhar para ela? (Pausa. Idem.) Eu compreendo-te. (Pausa. Idem.) Compreendo-te perfeitamente. (Pausa. Idem.) Uma pessoa parece não estar a pedir muito, há mesmo alturas em que seria quase impossível (Voz entrecortada.) pedir menos – a um semelhante – é o menos que se pode dizer – enquanto que na verdade quando se pensa bem – profundamente – afinal de contas o outro precisa tanto de paz – tanto que o deixem em paz – que foi talvez a lua todo este tempo – estivemos talvez a pedir a lua.
- Samuel Beckett

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