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Não queria voltar a escrever. Não queria que mais letras se fixassem aqui enquanto as lágrimas não secassem e me deixassem olhar para novas palavras que me atacam como punhais. Leio-te tão fundo, sinto-te tão fundo e, no entanto, nunca pude verdadeiramente mostrar-te como existo, quanto existo. Sim, sempre foi preciso coragem e nunca tive, não a necessária para que sempre que visito um espelho não me invadisse a sensação de que apenas uma pedra me ocupa o corpo, a mesma pedra que sabe amar sem saber como o fazer. Agora, em surdina, vou alimentando este lugar vazio, só preenchido com pedaços de ti que roubo em cada lugar por onde te encontro, por trás de cada olhar que consigo fixar nos raros momentos em que a ausência parece ter acabado. Por quanto tempo mais estarei preso nesta vontade de existirmos? Por quanto tempo serei empurrado por mim mesmo até ao que vou tendo de ti? Sufocante, desgastante, apaixonante esta irracionalidade de que é feita a nossa existência. Feita de silêncios, feita de fugas, feita de olhares disfarçados, feita de vontades reprimidas de gritar: "Vem!", feita do sofrimento de um sonho que nunca mais chega e que partiu porque o pouco que nos afastava pesou mais do que o muito que nos empurrava. (Oldmirror)

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