- Se ninguém morreu, então trata-se de ti.Mas se sentes que vais morrer, quero estar contigo.Quando morri não tive ninguém por perto...Portanto, se é a sério, há um programa para o dia em que se morre.Primeiro rir com imbecis, depois há uma coisa a dizer a alguém, uma coisa que queiras dizer mesmo, boa ou má, uma coisa que nunca disseste. Porque no dia em que morres tens total liberdade de palavra.- Como foi, o dia em que morreste?- Isso já passou. Já me recompus. Já não há nada a dizer. Graças a Deus.Como eu desejo a que ali vai na rua,tão ágil, tão agreste, tão de amor...Como eu quisera emaranhá-la nua,bebê-la em espasmos de harmonia e cor!...Desejo errado... Se eu a tivera um dia,toda sem véus, a carne estilizadasob o meu corpo arfando transbordada,nem mesmo assim – ó ânsia! – eu a teria...Eu vibraria só agonizantesobre o seu corpo de êxtases dourados,se fosse aqueles seios transtornados,se fosse aquele sexo aglutinante...De embate ao meu amor todo me ruo,e vejo-me em destroço até vencendo:é que eu teria só, sentindo e sendoaquilo que estrebucho e não possuo.- Mário de Sá-CarneiroEtiquetas: Mário de Sá-Carneiro