9/20/2007

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É demasiado diferente o tempo que sentimos e o tempo que o relógio que seguramos no pulso direito nos mostra. É demasiado diferente o mundo que vamos conservando com a perícia de um antiquário e aquele que nos entra pelos pulmões sempre que abrimos a janela das traseiras, a única que nos liga umbilicalmente ao mundo fora das quatro paredes onde encerramos esta feroz guerra de mundos que travamos sabe-se lá porquê. Sabemos exactamente o que querem dizer aqueles que desabafam: "não sou deste mundo", "já não é do meu tempo". Sabemos que talvez não hesitassemos se um dia pudéssemos regressar aquele futuro que ficou perdido nos corredores dos mundos e dos tempos, sem que fossemos capazes de o resgatar. Talvez um dia, consigamos a coragem de acordar com o despertador do tempo sentido e nos possamos esquecer do tempo frio que trazemos agarrado ao corpo. Talvez um dia consigamos que os mundos que pisamos sejam os mundos que quisermos. (Oldmirror)
Jantáramos os dois pela primeira vez:
amizade ou amor, pouco interessava
desde que ali estivesses. O meu mundo
ia mudando à medida do teu,
a cada gesto vão da vã conversa
antes que fôssemos p'lo Bairro Alto
e enfim o Lumiar, a tua casa.
Eu podia contar uma história, dizer
como aquele rosto atravessava o meu -
mas não,
«nada de narrativas, nunca mais».
Apenas a certeza de estar morto
há tanto tempo, que já não me lembro
de cor nenhuma dos teus olhos. Não,
já não existe o dia nem a noite
e este silêncio deve ser talvez
a única resposta. É bem melhor
ficar à espera de que não regresses.
- Fernando Pinto do Amaral

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9/14/2007

213



Por mais cálculos que fizesse nunca chegava à equação perfeita que explicasse a impossibilidade de prever o futuro, muito menos um que lhe permitisse traçar um equilibrado calendário de emoções cuidadosamente distribuídas pelos anos que lhe restam. Rodeara-se das mais frias e racionais mentes para que ajudassem na busca das variantes que possibilitassem a descoberta da fórmula que compõe a emoção com o objectivo de a tornar previsível, mas não o conseguira. O maior progresso até então fora ainda não ter elouquecido. Dizem os que sabem, que não faltará muito. O coração já terá parado. (Oldmirror)
A última hora do dia é a melhor
tudo é tarde de mais e cedo de mais.
Pode ser que esteja feliz,
mas também pode ser do muito trabalho,
que me põe tonto, e nada me importa:
amanhã tenho de certeza dores de cabeça,
porque me ocorre que mesmo tu podes morrer.
O poema em que trabalhei a noite inteira,
só faz fumo como a lamparina velha.
Esvazio o cinzeiro e vou mijar.
Todos os dias tudo acaba.
- SØren Ulrik Thomsen

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