4/30/2008

255


É preciso dançar!

Convoca-me para uma dança
de Matisse
unidade de sal e luz na rotação
do sopro
que resta. Sossega o golpe do choro
não chorado.
Dança até o corpo ser indecifrável.
- Maria Augusta Silva

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4/29/2008

254


Post it #1: Frigorifico virtual.
Post it #2: Non authorized dealers.
Post it #3: Deixei-te yogurtes.
Post it #4: Ambíguo vs Concreto
Post it #5: Morangos, pão fresco e o jornal
(to be continued someday)

...nesse dia ele parecia-se tanto consigo que se confundia,
tal como o dia se confundia consigo mesmo
e a confusão a ambos confundia...
- Per Aage Brandt

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4/26/2008

253



Jogas? Até onde? (Oldmirror)

It's time to play the game...
TIME TO PLAY THE GAME!
It's all about the game and how you play it.
All about control and if you can take it.
All about your debt and if you can pay it.
It's all about pain and who's gonna make it.
I am the game, you don't wanna play me.
I am control, no way you can change me.
I am heavy debt, no way you can pay me.
I am the pain and I know you can't take me.
Look over your shoulder, ready to run.
Like a good little bitch, from a smokin gun.
I am the game and I make the rules.
To move on out here and die like a fool.
Try to figure out what my moods gonna be.
Come on over sucker, why don't you ask me?
Don't you forget that the price you can pay
Cause I am the game and I want to play....
- Motorhead

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4/22/2008

252



Cá estás tu na luz do fundo do túnel. Sem teres encontrado o pote de ouro. (Oldmirror)

Tu lutas contra esta figura que dentro de ti te impele; tu queres fugir de ti próprio, queres separar-te de ti mesmo, e não podes. Só consegues, à custa de esforços desesperados, manteres-te dentro da fórmula ou da máscara que escolheste, e arredar o crime e a loucura, e fingir e sorrir.
- Raul Brandão

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4/19/2008

251


Daniela tinha essa característica, nunca mostrara ser mais do que uma enorme colecção de ambiguidades. Daniela escondia-se atrás de coisa nenhuma e deixava os seus tesouros no meio da multidão, onde sempre estiveram seguros, imperceptíveis. Daniela era uma espécie de ilha onde demasiados náufragos tentavam atracar mas onde poucos verdadeiramente conseguiam instalar-se. Mesmo assim, Daniela mostrava-se acessível a quem a quisesse explorar, muitos acham mesmo que a haviam conseguido conhecer como as palmas da mão, havia até os que sentiam que tinham conseguido instalar-se naquela ilha de todos os prazeres. Nessa altura, Daniela sorria pois sabia que a exploração que os outros faziam não era mais do que a sua própria exploração dos outros. João sempre navegara sozinho, nunca quisera perder-se em demasiadas explorações nas ilhas onde parava para satisfazer o desejo de sentir o seu corpo num qualquer chão. João não se deixava explorar mas também nunca quisera explorar mais do que a sua própria existência. João não era ambíguo, mas sempre fora vago. Nunca coleccionara tesouros e nunca se sentira náufrago, mesmo no momento em que tocou com a ponta dos dedos dos pés nos primeiros grãos de areia daquela ilha. Ao toque, João sentiu vontade de explorar. Ao toque, Daniela sentiu-se plantada muito mais do que explorada e, por momentos, despida da densa floresta que por tantas vezes fizera desistir os mais experientes exploradores. (Oldmirror)

"Vem embora comigo", disse ele, vamos viver numa ilha deserta.
Eu disse, "eu sou uma ilha deserta", mas não era isso que ele tinha em mente.
- Margaret Atwood

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4/18/2008

250


Sara sentia-se só. Francisco há muito que não olhava para Sara, há muito que não olhava para ninguém. Sara ainda tentara seguir os conselhos da revista feminina, passeando-se com lingerie escura que oferecia mais luz à sua pele clara. Francisco, esquecera-se da última vez que se barbeara e os pêlos junto à boca, onde outrora existiam uns lábios apetecíveis, começavam a amarelecer pela nicotina demasiadamente presente. Sara desistira de Francisco pois sabia que Francisco embora não tivesse desistido dela, esquecera-se da sua existência. Francisco esquecera-se dele próprio e ficara refém de uma viagem pelas páginas de Proust de onde nunca mais conseguiu sair. Sara mantinha Francisco vivo porque ainda o amava. Francisco estava convencido que era Proust que o alimentava e que cada gole de café que lhe chegava ao estômago, ou cada trago de sopa que sentira engolir, eram simplesmente sensações decorrentes do "Prazeres e os Dias". Sara habituara-se ao isolamento de Francisco durante alguns dias no quarto dos hóspedes. Francisco, mudava de divisão cambaleando lentamente, durante curtas pausas para assimilar frases. Sara já não via Francisco há três dias. Francisco morrera "Em Busca do Tempo Perdido". (Oldmirror)

... se ele ainda estiver a dormir quando eu voltar ao quarto, e o clavicórdio continuar a reger o abismo com a sua simples presença e a sonoridade que pressinto, sento-me à entrada da ausência, aspirando o meu vagar nocturno e o movimento dos músculos das árvores,
lugar particular ali,
lugar universal aqui.
- Maria Gabriela Llansol

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4/16/2008

249



Carlos caminhava sempre de frente para o sol, Sandra caminhava na sombra de Carlos. Carlos nunca conhecera os contornos da sombra, Sandra nunca sentira na pele o calor da claridade. Sandra amava Carlos e por isso seguia-o para onde fosse. Carlos que nunca conhecera a sua sombra, nunca soube da existência de Sandra. (Oldmirror)

...a noite penetra-nos
através dos acidentes que temos
infligido um ao outro.
- Margaret Atwood

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4/15/2008

248



Aqui tudo é mau, não entres. Aqui o negro não é puramente estético, como o fumo não desenha formas românticas no ar, o fumo que aqui sentes fere os pulmões, mata-te. Aqui o amor é uma ilusão e o sexo sabe a lágrimas geladas de tanto descerem os corpos. Não procures por aqui o conforto, contenta-te com o arrepio e o soco no estômago. Não leias as palavras como se elas te mostrassem a sétima maravilha, lê-as como se fossem facas apontadas às costas, o canhão que te destruirá a carne. Aqui a única profissão admitida é a de falhado, a de orgulhosamente descamisado. Não admires, revolta-te. Não sorrias, chora. Não te inspires, autoflagela-te. Não te aproximes, espreita de longe, não queiras mais. E vai, esquece o que viste. Detesta. Se não gostas de fel, se tens boas intenções, se acreditas na regeneração, se sonhas a cores, se estás em paz, se consegues espreitar, nem que por um segundo, algo de bom, então vai-te. Aqui tudo é mau, não entres. (Oldmirror)

4/14/2008

247



Luta, cai, sangra, sofre, transpira, mas faz qualquer coisa. (Oldmirror)

The confusion in her eyes it says it all
She's lost control
And she's clinging the nearest passerby
She's lost control again
And she gave away the secrets of the past and said
I've lost control again
And the voice who told her when and where and why she said
I've lost control again
And she turned around and took me by the hand and said
I've lost control again
An how I've never felt just why I don't understand she said
I've lost control again
And she screamed out kicking on her side and said
I've lost control again
And she's upon the floor; I thought she died she said
I've lost control again
She's lost control again
She's lost control
And I had to phone her friend to state my case and say
She's lost control again
And she showed up all the errors of the states and said
I've lost control again
And she expressed herself in many different ways until
She lost control again
I walked upon the edge of no escape and laughed
I've lost control again
She's lost control again
She's lost control
- Ian Curtis

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4/11/2008

246



Why love never touches my heart as fear does...

4/10/2008

245



Quando a mente se encontra sobrelotada apenas resta o corpo. Oferecer a carne ao derradeiro sacrifício, em busca de contínuas emoções, na procura de ininterruptas sensações, ambicionando gravar em nós todas as explicações. (Oldmirror)

4/07/2008

244



Voltar a casa, tocar o chão, relembrar as raízes. Tomar um banho de verdade, despir a fantasia das emoções, retirar o deslumbrante fato das histórias de encantar e pisar terrenos que por momentos foram esquecidos. Lembra-te de onde vens, muito mais do que para onde pensaste ir. (Oldmirror)

...e de tudo os espelhos são a invenção mais impura
- Herberto Helder

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4/06/2008

243


Part I: Borges escrevera o "Livro dos Seres Imaginários". Borges não era um Ser Imaginário, existia, "mesmo que não seja exactamente como o escrevo". Borges tinha mãos, tinha cheiro, tinha tudo o que o tinha tornado num Ser Imaginário.
Part II: A segunda parte fala de Borges, de praia, de conversas, de uma vida que podia ser vivida, de entendimento. A segunda parte fala de experiências e de um "at last" antecipado por um arriscar fora do mapa. A segunda fala de um início, de um momento onde tudo para trás parece fazer sentido e tudo para a frente continua uma estrada em que ainda ninguém se atreveu a entrar. (Oldmirror)

Borges e eu
Ao outro, a Borges, é que acontecem as coisas. Eu caminho por Buenos Aires e demoro-me, talvez já mecanicamente, na contemplação do arco de um saguão e da cancela; de Borges tenho notícias pelo correio e vejo o seu nome num trio de professores ou num dicionário biográfico. Agra­dam-me os relógios de areia, os mapas, a tipografia do século XVIII, as etimologias, o sabor do café e a prosa de Stevenson; o outro comunga dessas preferências, mas de um modo vaidoso que as converte em atribu­tos de um actor. Seria exagerado afirmar que a nossa relação é hostil; eu vivo, eu deixo-me viver, para que Borges possa urdir a sua literatura, e essa literatura justifica-me. Não me custa confessar que conseguiu certas páginas válidas, mas essas páginas não me podem salvar, talvez porque o bom já não seja de alguém, nem sequer do outro, mas da linguagem ou da tradição. Quanto ao mais, estou destinado a perder-me definitivamen­te, e só algum instante de mim poderá sobreviver no outro. Pouco a pouco vou-lhe cedendo tudo, ainda que me conste o seu perverso hábito de falsificar e magnificar. Espinosa entendeu que todas as coisas querem perseverar no seu ser; a pedra eternamente quer ser pedra, e o tigre um tigre. Eu hei-de ficar em Borges, não em mim (se é que sou alguém), mas reconheço-me menos nos seus livros do que em muitos outros ou no laborioso toque de uma viola. Há anos tratei de me livrar dele e passei das mitologias do arrabalde aos jogos com o tempo e com o infinito, mas esses jogos agora são de Borges e terei de imaginar outras coisas. Assim, a minha vida é uma fuga e tudo perco, tudo é do esquecimento ou do outro.
Não sei qual dos dois escreve esta página.

- Jorge Luís Borges

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4/01/2008

242


Bom, muito bom, era aquilo que lhe ecoava na cabeça. Ao acordar parecera-lhe uma espécie de sonho que acontecera à velocidade da luz. Tudo demasiado rápido, tudo demasiado sentido, tudo demasiado intenso, tudo demasiado vertiginoso para que houvesse tempo de saborear. Mas tinha a certeza que o saboreara, que gostara, que fora real, que acontecera. Desejava que o tempo fosse mais tempo. Sabia que que agora seria uma questão de tempo. Tempo para ficar, tempo para partir, tempo para saber em que gaveta temporal colocaria aquele pedaço de tempo que passara demasiado veloz em direcção à sua pele, aos seus sentidos, à sua cabeça. Mas agora não tinha tempo e por isso o denso episódio continuava a gravitar num vazio temporal até que finalmente o tempo ditasse qual seria o seu derradeiro destino. (Oldmirror)

Ouvi falar de gente civilizada,
os matrimónios temperados por conversas, elegantes e
honestos, racionais. Mas tu e eu somos
selvagens. Tu chegas com um saco,
entregas-mo em silêncio.
Sei logo que é Porco Moo Shu pelo cheiro
e percebo a mensagem: dei-te imenso
prazer ontem à noite. Sentamo-nos
tranquilamente, lado a lado, para comer,
os crepes compridos suspensos a entornar,
o molho fragrante a escorrer,
e de esguelha olhamos um para o outro, sem palavras,
os cantos dos olhos limpos como pontas de lança
pousadas no parapeito para mostrar
que aqui um amigo se senta com um amigo.
- Sharon Olds

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