10/28/2010

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Nunca fora voyeur. O que o levava a espreitar pela janela, olhando o prédio em frente, onde quase todas as noites aquele casal se envolvia, como se fosse a primeira vez, era a sensação de olhar para um espelho que o projectava ao passado. Também ele se envolvera, esquecendo as cortinas, ignorando os ruídos fazendo de cada momento o último à face da Terra. Ao vê-los não evitava um sorriso melancólico. Há muito que esquecera a vertigem do sentimento que o levava a abrir a janela do quarto ao Mundo. (Oldmirror)

Enquanto não vivi a minha própria vida, enquanto a vida alheia me levava nas suas ondas, enquanto acreditava que a vida tinha sentido, embora eu não fosse capaz de o exprimir, todo o género de reflexões da vida na poesia e nas artes me dava alegria; eu tinha prazer em mirar a vida no espelhinho da arte; porém, quando comecei a procurar o sentido da vida, quando senti a necessidade de ter a minha própria vida, esse espelho tornou-se inútil para mim, ou então ridículo, ou então torturante.
- Léon Tolstói

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10/16/2010

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O que nos corrói são as contas. Demasiadas contas subtrair, escassas as de somar, multiplicar e, sobretudo, dividir. O que nos mata são as contas. Contar com valores alheios, contar com escudos invisíveis, contar com as históricas retenções na fonte de quem nunca procurou sentir mais do que alguns cêntimos nos bolsos. Somassemos, multiplicassemos e dividissemos nós e o resultado final no deve e no haver do que nos vai no peito, raras vezes chegaria à nulidade, à unidade e até ao menor dos números pares. (Oldmirror)

Somos poeira, mas poeira enamorada!
- João César Monteiro (As Bodas de Deus)

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10/13/2010

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Indecisão. Necessidade absoluta de decidir. Escolher. Seguir por um dos caminhos. Agir. Acções demasiado dolorosas para a quem basta deixar-se levar pelo rio, sabendo de antemão onde acabará. Projectar cenários. Antever o futuro. Justificar gestos. Argumentar. Obrigações insuportáveis para quem há muito decidiu simplesmente existir. Corresponder a olhares. Disfarçar o desinteresse. Completar metades. Representações inverosímeis de quem apenas entrou na peça por obrigação, sob a promessa que nada mais seria do que um minúsculo "product placement", longe da tábua onde passeiam os protagonistas. (Oldmirror)

Não sei para que lado da noite me hei-de virar
onde esconder de ti o rio de fogo das lágrimas
quase a transbordar e acendo mais um cigarro
e falo atabalhoadamente de um futuro qualquer
e suspiro de alívio porque não ouves o que digo
ou se calhar também não sabes onde te esconder
esesperamos que se ilumine o lado certo da noite...
- Carlos Alberto Machado

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