12/28/2006

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Foi mais do mesmo. Mais daquilo que se julga ser tudo e nada mais é do que trémulas decorações de uma vida que continua a ser usada mas não partilhada e nada aproveitada. Somos constantemente enganados pelos sentidos e pela enorme vontade de vermos nos pormenores um bater de coração que pouco mais é do que um movimento repetitivo em tudo igual ao pêndulo do relógio que nos anuncia a passagem de mais uma fronteira sem que verdadeiramente tenhamos bebido tudo o que podíamos nos momentos por onde passamos apressados e egoístas. (Oldmirror)

Those who knew
what was going on here
must make way for
those who know little.
And less than little.
And finally as little as nothing.
In the grass that has overgrown

causes and effects,
someone must be stretched out
blade of grass in his mouth
gazing at the clouds.

- Wislawa Szymborska

Because, death is certain for the one who is born, and birth is certain for the one who dies. Therefore, you should not lament over the inevitable.
The end of birth is death; the end of death Is birth: this is ordained! And mournest thou, Chief of the stalwart arm! for what befalls which could not otherwise befall?


-Bhagavad-Gita

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12/18/2006

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Talvez fosse melhor renascer. (Oldmirror)

Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
- Vinicius de Moraes

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12/14/2006

171



Somos diferentes, princesa. Tu nasces e eu morro. Tu olhas as estrelas e vês desejos por realizar, eu vejo-as demasiado distantes e fixo-me na Lua. Parecemo-nos mas não nos equivalemos. Tu chamas-lhes amigos e eu acho-as pessoas. O sangue corre-nos nas veias, mas o teu é quente e o meu gelou. Mesmo assim amamo-nos. Tu amas-me a sabedoria eu amo-te o poder da descoberta. Somos diferentes, princesa, une-nos o Mundo, separa-nos o Tempo. (Oldmirror)

There ain't nothing I can do, or nothing I can say,
Some folks will criticize me.
So I'm gonna do just what I want to anyway,
And don't care if you all despise me.
If I should take a notion

To jump into the ocean,
It ain't nobody's business if I do.
If I go to church on Sunday

And I shimmy down on Monday,
It ain't nobody's business if I do.
And if my friend ain't got no money

And I say, "All right, take all of mine honey,"
It ain't nobody's business if I do.
If I lend her my last nickel

And it leaves me in a pickle,
It ain't nobody's business if I do.
I would rather my gal would hit me

Than to haul right up and quit me.
It ain't nobody's business if I do.
I know that she won't call no copper

If she gets beat up by her poppa.
It ain't nobody's business if I do, Lord no.
Well, it ain't nobody's business if I do.

- P. Grainger/ E. Robbins/ Billie Holiday

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12/12/2006

170



Olha para trás e caminha sem veres o que podes vir a encontrar. Fecha os olhos e segue em frente com o passo apressado. Fecha o coração e entrega-te a quem te reclamar. Não fales e conta a história da tua vida como se de um filme mudo se tratasse. Não ouças o que te dizem e aconselha-te a ti mesmo. Desiste sempre mas começa tudo de novo. Aposta e perde, ganharás novo fôlego. Morre, viverás como nunca. Escolhe um deles, não os sigas todos, correrás o risco de ser feliz. (Oldmirror)

O sol é sempre o mesmo e o céu azul
ora é azul, nitidamente azul,
ora é cinza, negro, quase-verde...
Mas nunca tem a cor inesperada.
O mundo não se modifica.
As árvores dão flores,
folhas, frutos e pássaros
como máquinas verdes.
As paisagens também não se transformam.
Não cai neve vermelha, não há flores que voem,
a lua não tem olhos
e ninguém vai pintar olhos à lua.
Tudo é igual, mecânico e exacto.
Ainda por cima, os homens são os homens.
Soluçam, bebem, riem e digerem
sem imaginação.E há bairros miseráveis, sempre os mesmos,
discursos de Mussolini,
guerras, orgulhos em transe, automóveis de corrida...
E obrigam-me a viver até à Morte!
Pois não era mais humano
morrer por um bocadinho,
de vez em quando,
e recomeçar depois,
achando tudo mais novo?
Ah! se eu pudesse suicidar-me por seis meses,
morrer em cima de um divã
com a cabeça sobre uma almofada,
confiante e sereno por saber
que tu velavas por mim, meu amor do Norte.
Quando viessem perguntar por mim,
havias de dizer com o teu sorriso
onde arde um coração em melodia:
"Matou-se esta manhã.
Agora não o vou ressuscitar
por uma bagatela."
E virias depois, suavemente,
velar por mim, subtil e cuidadosa,
pé ante pé, não fosses acordar
a Morte ainda menina no meu colo...
-José Gomes Ferreira

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12/11/2006

169



Tudo aquilo em que mergulhava o olhar era a mais pura das realidades. Sempre acreditara naquilo que os seus olhos mostravam e os olhos mostravam-lhe sempre o sonho, a fantasia e a dor que apenas existia para fazer ver que afinal nem mesmo ela afastava o cor de rosa de uma vida que conseguia ir mais além do que a simples realidade que aqueles que desistiam de mergulhar o olhar na fantasia e nos sonhos. Ouvira dizer que um dia tudo isso mudaria e o olhar passaria a reparar nos negros com que a realidade também se pintava, mas a promessa de nunca deixar de viver com os olhos postos nas cores do arco-iris já fora feita há muito. (Oldmirror)

No abismo aberto entre dois minutos
Mesmo caindo a mão levanto.
Existo. E digo: presente.

- Zoltán Zelk

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12/04/2006

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Vasculho no interior um pedaço de memória que me faça lembrar que existi antes de me tornar neste livro branco. Leio a história da frente para trás em busca das frases que compuseram o poema e apenas vislumbro reticências e interrogações, uma ou outra exclamação, sempre nos momentos em que o rumo da história se aproximava de um final feliz. E se é verdade que não existi antes e que existem dúvidas quanto à existência depois? Reconheço, escasseiam as memórias passadas e as futuras memórias, no entanto, o presente está bem presente, mesmo que exista apenas como estrada sinuosa onde busco o caminho que me ensine como chegar ao passado sem ter que passar pelo futuro. (Oldmirror)

Mas em que pensava eu antes de me perder a ver? Não sei.
Vontade?
Esforço?
Vida?
Com um grande avanço de luz sente-se que o céu é já quase todo azul. Mas não há sossego - Ah, nem o haverá nunca! - no fundo do meu coração, poço velho ao fim da quinta vendida, memória de infância fechada a pó no sotão de casa alheia. Não há sossego - e,
ai de mim!, nem sequer há desejo de o ter...

- Bernardo Soares

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12/03/2006

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As raízes cortadas fazem falta agora que a viagem vai chegando ao fim sem que os mundos encontrados fossem o mundo procurado. Tê-las tirado debaixo dos pés sem conseguir que saíssem da memória foi acto desesperado de quem ainda espera a existência ao virar da esquina e não se contenta com o que vê quando espreita por trás dos ombros. Voltarão a crescer raízes se a terra por baixo dos pés se mantém árida e de ninguém? (Oldmirror)

...theres a ship
that sails by my window
there's a ship that sails on by
there's a world under it
i think i see it
sailing away.

- Mazzy Star

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