6/29/2011

428


I. Entretidos na arte de esquecer, esquecemo-nos de reparar, de olhar em volta, de cruzar sensações, vontades. Procuramos receitas, aceitamos lições, experimentamos mezinhas e visitamos curandeiros. Pagamos para esquecer mesmo que para isso nos esqueçamos de viver.
II. Subira e descera as escadas inúmeras vezes. A impaciência tinha tomado conta daquele corpo agitado pela descoberta que fizera. Finalmente, saberia como esquecer. Encomendara a fórmula mágica e esperava agora que a campaínha tocasse e lhe fosse entregue em mãos aquilo que resolveria os dias sempre cinzentos que se haviam instalado de forma quase permanente. A fórmula mágica fez-se anunciar do outro lado da porta, era chegado o momento. Enquanto ia ao seu encontro interrogava-se como seria viver depois de esquecer. Já se havia esquecido. É lugar comum dizer-se que nos habituamos a viver com a dor. Se com ela vivemos demasiado tempo, viver sem ela assemelha-se a voltar a aprender a andar. Viver depois de esquecer tinha sido esquecido e isso estava prestes a acabar. A porta abriu-se e o braço esticou-se para receber o envelope da fórmula mágica que tudo faria esquecer. Recebeu-o e, de imediato, iniciou a leitura, ali mesmo.
- Preciso que assine aqui... - disseram do outro lado.
Nessa altura já se havia esquecido que a porta estava aberta e que o mensageiro ali permanecia. Nesse momento, a pele perdera a cor, as pernas tremiam e os olhos espelhavam uma gigantesca desilusão. Afinal, já conhecia a fórmula mágica. Tudo que lia não lhe era desconhecido e nunca havia resultado. Era o fim. Nunca seria possível esquecer.
- Preciso que assine aqui... - repetiram do outro lado.
De ombros caídos, cor perdida e forças inexistentes, desviou os olhos do envelope, entretanto caído ao lado dos pés, levantou a cabeça preparando-se para cumprir o pedido que lhe fora dirigido do outro lado da porta e tudo mudou. O brilho surgiu vindo do nada, a vida pintou-se de cores inventadas num arco-íris secreto, o coração deu sinais de vida e...por muito que tentasse não se lembrava do que queria esquecer. Nunca fora a fórmula secreta.
Não era a mensagem. Era o mensageiro.
- Oldmirror
.
Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguem antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma.
(…)É preciso aceitar esta mágoa, esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução.
(…)Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado. O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.

- Miguel Esteves Cardoso [apanhado num "Crime" demasiado "Perfeito"]

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6/27/2011

427



Viver. Apenas isso deveria bastar. (Oldmirror)


Inventarei o dia onde contigo
e o outono corra pelas ruas.
A luz que pisamos é tão perfeita
que não pode morrer, como não morre
o brilho do olhar que te viu despir.
- Eugénio Andrade

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6/22/2011

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6/20/2011

426



Os passos do relógio tranquilos mas decididos mostravam-lhe um destino que procurara maquilhar por entre letras, sons e contas cujo resultado final nunca ia além de falsos arredondamentos que permitissem que o sonho durasse mais minutos, que o relógio, por uma vez, aceitasse sentar-se e descansar. Talvez se habituasse, talvez se enternecesse, talvez achasse que a pressa dos passos não fizesse sentido, não tanto como sentir o resto das ondas tocarem o resto do corpo. Distracções apenas. Por entre letras, sons e falsos arredondamentos; por entre curvas inventadas em rectas impenetráveis, os passos decididos do relógio resistiam, avançavam e cada passo dado deixava para trás um sonho por cumprir, uma certeza por confirmar. Quando a luz o mostra de relance, não há gota de suor que indique que o cansaço se instala e que os passos abrandarão a cadência, não há poema ou história de amor que o impeçam de seguir em frente, afinal, será ele o único que mantém o plano traçado, o objectivo definido. É urgente cumprir o sonho, é crítico confirmar a certeza, antes que a sola dos passos do relógio esmague por completo mais esta curva apertada. (Oldmirror)

And I always find, yeah, I always find something wrong You been putting up with my shit just way too long
I'm so gifted at finding what I don't like the most
So I think it's time for us to have a toast
Let's have a toast for the douchebags
Let's have a toast for the assholes
Let's have a toast for the scumbags
Every one of them that I know
Let's have a toast for the jerk-offs
That'll never take work off
Baby, I got a plan
Runaway fast as you can
She find pictures in my email
I sent this bitch a picture of my dick
I don't know what it is with females
But I'm not too good at that shit
See, I could have me a good girl
And still be addicted to them hood rats
And I just blame everything on you
At least you know that's what I'm good at
And I always find, yeah, I always find, yeah, I always find something wrong
You been putting up with my shit just way too long
I'm so gifted at finding what I don't like the most
So I think it's time for us to have a toast
Let's have a toast for the douchebags
Let's have a toast for the assholes
Let's have a toast for the scumbags
Every one of them that I know
Let's have a toast for the jerk-offs
That'll never take work off
Baby, I got a plan
Runaway fast as you can
Runaway from me, baby
Runaway, runaway from me, baby
Runaway I'm about to get crazy, then runaway
Use the thug plan, runaway as fast as you can
Runaway from me, baby
Runaway, runaway from me, baby
Runaway, I'm about to get crazy
Why can't she just runaway?
Baby I got a plan, runaway as fast as you can
24/7, 365, pussy stays on my mind
I-I-I did it, alright, alright, I admit it
Now pick your next move
You could leave or live with it
Ichabod Crane with that motherfucking top off
Split and go where? Back to wearing knockoffs, ha, ha
Knock it off, Neiman's, shop it off
Let's talk over Mai Tai's, waitress, top it off
Ho's like vultures, wanna fly in your Freddy loafers
You can't blame 'em, they ain't never seen Versace sofas
Every bag, every blouse, every bracelet
Comes with a price tag, baby, face it
You should leave if you can't accept the basics
Plenty ho's in the baller-nigger matrix
Invisibly set, the Rolex is faceless
I'm just young, rich and tasteless, P
Never was much of a romantic
I could never take the intimacy
And I know it did damage
'Cause the look in your eyes is killing me
I guess you knew another vantage
'Cause you could blame me for everything
And I don't know how I'ma manage
If one day you just up and leave
And I always find, yeah, I always find something wrong
You been putting up with my shit just way too long
I'm so gifted at finding what I don't like the most
So I think it's time for us to have a toast
Let's have a toast for the douchebags
Let's have a toast for the assholes
Let's have a toast for the scumbags
Every one of them that I know
Let's have a toast for the jerk-offs
That'll never take work off
Baby, I got a plan
Runaway fast as you can
- Kanye West

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425



Ela inspira e ele expira. Esta é a definição de dois corpos transformados num só. Tudo o resto é solidão, tudo o resto é incompreensão, incapacidade na entrega. É fácil chegar perto, é difícil aceitá-lo. (Oldmirror)


Há um motivo para eu ter dito que seria feliz sozinha. Não foi por pensar que seria feliz sozinha. Foi por pensar que, se amasse alguém e isso corresse mal, podia não aguentar.
É mais fácil estar sozinha.
E se aprendemos que precisamos de amor e depois não o temos? E se gostamos disso? E nos apoiamos nisso? E se construirmos a nossa vida em torno disso e depois tudo se desmoronar? Conseguimos sobreviver a esse tipo de dor? Perder o amor é como uma lesão num órgão. É como morrer. A única diferença é que a morte termina. Isto? Isto pode durar para sempre.
- G's A

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6/14/2011

424



Antes de conseguirmos cumprir um sonho é preciso conseguirmos acreditar, independentemente das quedas que o percurso nos venha a oferecer. Se não o cumprirmos é porque em algum momento deixamos de acreditar ou porque fomos incapazes de por ele lutar e se assim aconteceu é porque não merecemos o sonho que um dia tivemos. (Oldmirror)

"Ela diz...", contou-nos ele por fim, "...que há uma palavra japonesa, gattai, para quando duas ou mais coisas se juntam para de algum modo se tornarem numa só...".
- Peter Carey

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6/13/2011

423



Aproxima-se a desistência. O corpo não dá mais e a vontade tem sido vencida pela parede erguida que impede a visão do horizonte. Aproxima-se a rendição. O corpo cravejado de investidas inglórias vai sangrando o pouco que resta sem que o olhar alcance qualquer praia. Demasiadas braçadas contra a corrente, sob uma água que teima em não dar tréguas, vai destruindo o mais férreo desejo de abraçar a areia que se afasta a cada tentativa de a alcançar. Sem forças, persiste mais forte a ideia de flutuar, de entregar à maré, de oferecer à corrente o destino e a praia em que nos queira largar. (Oldmirror)


Se tens um coração de ferro, bom proveito.
O meu, fizeram-no de carne, e sangra todo dia.
- José Saramago

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6/07/2011

422


Esgoto as palavras que tenho na alma tentando resgatar quem nas palavras não tem fé. Esgoto a alma que tenho nas palavras tentando de devolvê-la a quem a entreguei mas quem a possui há muito que a deixou de usar. (Oldmirror)

Namora uma rapariga que lê. Namora uma rapariga que gaste o dinheiro dela em livros, em vez de roupas. Ela tem problemas de arrumação porque tem demasiados livros. Namora uma rapariga que tenha uma lista de livros que quer ler, que tenha um cartão da biblioteca desde os doze anos. Encontra uma rapariga que lê. Vais saber que é ela, porque anda sempre com um livro por ler dentro da mala. É aquela que percorre amorosamente as estantes da livraria, aquela que dá um grito imperceptível ao encontrar o livro que queria. Vês aquela miúda com ar estranho, cheirando as páginas de um livro velho, numa loja de livros em segunda mão? É a leitora. Nunca resistem a cheirar as páginas, especialmente quando ficam amarelas. Ela é a rapariga que lê enquanto espera no café ao fundo da rua. Se espreitares a chávena, vês que a espuma do leite ainda paira por cima, porque ela já está absorta. Perdida num mundo feito pelo autor. Senta-te. Ela pode ver-te de relance, porque a maior parte das raparigas que lêem não gostam de ser interrompidas. Pergunta-lhe se está a gostar do livro. Oferece-lhe outra chávena de café com leite. Diz-lhe o que realmente pensas do Murakami. Descobre se ela foi além do primeiro capítulo da Irmandade. Entende que, se ela disser ter percebido o Ulisses de James Joyce, é só para soar inteligente. Pergunta-lhe se gosta da Alice ou se gostaria de ser a Alice. É fácil namorar com uma rapariga que lê. Oferece-lhe livros no dia de anos, no Natal e em datas de aniversários. Oferece-lhe palavras como presente, em poemas, em canções. Oferece-lhe Neruda, Pound, Sexton, Cummings. Deixa-a saber que tu percebes que as palavras são amor. Percebe que ela sabe a diferença entre os livros e a realidade – mas, caramba, ela vai tentar fazer com que a vida se pareça um pouco com o seu livro favorito. Se ela conseguir, a culpa não será tua. Ela tem de arriscar, de alguma maneira. Mente-lhe. Se ela compreender a sintaxe, vai perceber a tua necessidade de mentir. Atrás das palavras existem outras coisas: motivação, valor, nuance, diálogo. Nunca será o fim do mundo. Desilude-a. Porque uma rapariga que lê compreende que falhar conduz sempre ao clímax. Porque essas raparigas sabem que todas as coisas chegam ao fim. Que podes sempre escrever uma sequela. Que podes começar outra vez e outra vez e continuar a ser o herói. Que na vida é suposto existir um vilão ou dois. Porquê assustares-te com tudo o que não és? As raparigas que lêem sabem que as pessoas, tal como as personagens, evoluem. Excepto na saga Crepúsculo. Se encontrares uma rapariga que leia, mantém-na perto de ti. Quando a vires acordada às duas da manhã, a chorar e a apertar um livro contra o peito, faz-lhe uma chávena de chá e abraça-a. Podes perdê-la por um par de horas, mas ela volta para ti. Falará como se as personagens do livro fossem reais, porque são mesmo, durante algum tempo. Vais declarar-te num balão de ar quente. Ou durante um concerto de rock. Ou, casualmente, na próxima vez que ela estiver doente. Pelo Skype. Vais sorrir tanto que te perguntarás por que é que o teu coração ainda não explodiu e espalhou sangue por todo o peito. Juntos, vão escrever a história das vossas vidas, terão crianças com nomes estranhos e gostos ainda mais estranhos. Ela vai apresentar os vossos filhos ao Gato do Chapéu e a Aslam, talvez no mesmo dia. Vão atravessar juntos os invernos da vossa velhice e ela recitará Keats, num sussurro, enquanto tu sacodes a neve das tuas botas. Namora uma rapariga que lê, porque tu mereces. Mereces uma rapariga que te pode dar a vida mais colorida que consegues imaginar. Se só lhe podes oferecer monotonia, horas requentadas e propostas mal cozinhadas, estás melhor sozinho. Mas se queres o mundo e os mundos que estão para além do mundo, então, namora uma rapariga que lê. Ou, melhor ainda, namora uma rapariga que escreve.
- Rosemary Urquico

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6/01/2011

421



Era uma vez um homem que se esqueceu como se faz amor....(Oldmirror)


Eu sou uma pessoa excitável que só entende a vida liricamente,
musicalmente, em quem sentimentos são muito mais fortes que a razão.
Eu estou tão sedenta para o maravilhoso que só o maravilhoso tem poder sobre mim
Qualquer coisa que eu não possa transformar em algo maravilhoso, eu deixo ir.
Realidade não me impressiona. Eu só acredito em êxtase,
e quando a vida ordinária me algemar, eu escapo, de uma maneira ou de outra.
Nenhum muro mais.
- Anaïs Nin

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